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Cardiotoxicidade

Toxicidade

A doxorrubicina é atualmente um dos anticancerígenos utilizados na clínica que apresenta maior potência e eficácia. No entanto, a sua vasta utilização nos últimos 50 anos encontra-se fortemente associada a um efeito secundário nefasto que afeta a morbilidade e mortalidade dos doentes: a cardiotoxicidade. [1,2] Este fármaco pode exercer efeitos agudos ou crónicos no sistema cardiovascular, chegando a causar 50% de mortalidade para as doses cumulativas mais elevadas. [3]

[1] Pereira, G. et al (2011) Drug-induced Cardiac Mitochondrial Toxicity and Protection: From Doxorubicin to Carvedilol, Current Pharmaceutical Design 17:2113-2129

 

[2] Raj, S.; Franco, V.I.; Lipshultz, S.E. (2014) Anthracycline-Induced Cardiotoxicity: A Review of Pathophysiology, Diagnosis, and Treatment. Current Treatment Options in Cardiovascular Medicine 16:315

 

[3] Takemura, G.; Fujiwara, H. (2007) Doxorubicin-Induced Cardiomyopathy From the Cardiotoxic Mechanisms to Management, Progress in Cardiovascular Diseases, Vol. 49, No. 5: 330-352

 

[4] Casarett & Doull’s Toxicology – The Basic Science of Poisons. McGraw-Hill 7th Edition, 593 (2008), 721-722

 

[5] Costa, V.M. et al (2013) The Heart As a Target for Xenobiotic Toxicity: The Cardiac Susceptibility to Oxidative Stress. Chemical Research in Toxicology 26:1285-1311

Efeitos cardíacos

Mecanismos de cardiotoxicidade

A doxorrubicina pode causar ainda efeitos crónicos (tabela 2) que, apesar de serem muito menos frequentes que os efeitos agudos, apresentam um mau prognóstico pois consistem em alterações cardiomiopáticas irreversíveis que podem levar a insuficiência cardíaca congestiva. [3] A toxicidade crónica pode ser observada dentro de um mês ou até mesmo anos após o tratamento, e depende da dose uma vez que a probabilidade de ocorrência destes eventos aumenta com a dose cumulativa. [1] O desenvolvimento de cardiomiopatia devido à toxicidade crónica da doxorrubicina está dependente de vários fatores de risco, como apresentado na tabela 3. 

Desde 1970 que os efeitos de toxicidade cardíaca da doxorrubicina são reconhecidos como uma grave complicação da terapêutica com antraciclinas. Contudo, apenas em 1991 foram identificados efeitos cardiotóxicos tardios em sobreviventes de leucemia infantil, o que veio trazer a descoberto o facto de este fármaco exercer efeitos tanto a curto como a longo prazo. [3]

Tabela 2. Sinais e sintomas cardíacos causados pela doxorrubicina [1,2,3]

Tabela 3. Fatores de risco para desenvolvimento de cardiomiopatia [1,3]

O mecanismo exato pelo qual a doxorrubicina exerce toxicidade cardíaca permanece por esclarecer, mas esta parece resultar de múltiplos mecanismos que atuam sinergicamente e são distintos do seu mecanismo de acção antitumoral. [3,4] Várias hipóteses têm sido propostas (tabela 4), no entanto o stress oxidativo causado pelo aumento da produção de espécies reativas de oxigénio (ROS), a supressão da expressão genética de proteínas do músculo cardíaco e a indução da apoptose parecem desempenhar um papel essencial no desenvolvimento da cardiomiopatia induzida pela doxorrubicina. [3]

Tabela 4. Mecanismos propostos de cardiotoxicidade da doxorrubicina [3]

A toxicidade aguda manifesta-se em 11% dos pacientes, levando ao aparecimento de sintomas (tabela 2) durante ou poucos dias após a primeira administração de doxorrubicina. Apesar da sua potencial gravidade, estes são geralmente reversíveis e controláveis, desaparecendo com a descontinuação do tratamento. [1,3]

Stress oxidativo

A estrutura química da doxorrubicina é propensa a gerar ROS, uma vez que possui uma quinona no anel central que é susceptível de redução, sendo convertida a semiquinona. Esta reacção de redução é catalisada por enzimas do complexo I mitocondrial, como a NADH desidrogenase, e ainda pela xantina oxidase, pelo citocromo P450 e pela óxido nítrico sintetase. [1,4,5] Durante este processo os electrões  libertados são captados pelo oxigénio molecular, que é então oxidado dando origem ao anião superóxido e outras ROS. [3] Estas espécies podem oxidar proteínas, lípidos e ácidos nucleicos e ainda causar cisão de cadeias de DNA. [4] Ao mesmo tempo, o grupo semiquinona é regenerado à quinona inicial, pelo que teoricamente este ciclo redox se pode dar continuamente. [1]

Supressão da expressão genética [1,4]

A doxorrubicina tem a capacidade de influenciar negativamente a expressão de diversas proteínas específicas do músculo cardíaco. A inibição de cada tipo de proteínas encontra-se associada a determinadas características associadas à cardiomiopatia induzida por este fármaco.

  • Inibição de proteínas contrácteis: provoca redução da contractilidade cardíaca, levando à perda de miofibrilhas do músculo cardíaco

  • Inibição de proteínas mitocondriais: causa defeitos na integridade mitocondrial e subsequente deterioração energética mitocondrial

  • Inibição de proteínas do retículo sarcoplasmático: interfere com a homeostasia do cálcio, causando disfunção diastólica

Apoptose

O mecanismo pelo qual a doxorrubicina induz a apoptose em cardiomiócitos e células endoteliais encontra-se relacionado com a produção de ROS como o peróxido de hidrogénio e o anião superóxido, uma vez que estes parecem activar a expressão de p53, dando-se a activação de vias apoptóticas. No entanto, o papel que a apoptose dos cardiomiócitos desempenha na cardiomiopatia induzida pela doxorrubicina permanece controverso. [3] 

Por que razão é o coração o órgão mais afetado? [1]

Maior acumulação de doxorrubicina no tecido cardíaco

Baixos níveis de antioxidantes nas células cardíacas

Alto conteúdo mitocondrial dos cardiomiócitos contribui para uma ativação exacerbada da doxorrubicina

Maior necessidade energética - maior dependência da energia mitocondrial

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